sexta-feira, dezembro 29, 2006

GRACIAS A LA VIDA
(Violeta Parra, 1917-1967)

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me dio dos luceros que, cuando los abro,
perfecto distingo lo negro del blanco,
y en el alto cielo su fondo estrellado
y en las multitudes el hombre que yo amo.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me ha dado el oído que, en todo su ancho,
graba noche y día grillos y canarios;
martillos, turbinas, ladridos, chubascos,
y la voz tan tierna de mi bien amado.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me ha dado el sonido y el abecedario,
con él las palabras que pienso y declaro:
madre, amigo, hermano, y luz alumbrando
la ruta del alma del que estoy amando.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me ha dado la marcha de mis pies cansados;
con ellos anduve ciudades y charcos,
playas y desiertos, montañas y llanos,
y la casa tuya, tu calle y tu patio.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me dio el corazón que agita su marco
cuando miro el fruto del cerebro humano;
cuando miro el bueno tan lejos del malo,
cuando miro el fondo de tus ojos claros.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me ha dado la risa y me ha dado el llanto.
Así yo distingo dicha de quebranto,
los dos materiales que forman mi canto,
y el canto de ustedes que es el mismo canto
y el canto de todos, que es mi propio canto.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.


BOM ANO DE 2007!



GRACIAS A LA VIDA. Música e letra de Violeta Parra (1917-1967), interpretada por Mercedes Sosa

sábado, dezembro 23, 2006

Poema do Menino Jesus
(Alberto Caeiro)

Num meio-dia de fim de Primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
Vi Jesus Cristo descer à terra.
Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.

Tinha fugido do céu.
Era nosso demais para fingir
De segunda pessoa da Trindade.
No céu tudo era falso, tudo em desacordo
Com flores e árvores e pedras.
No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem
E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
Com uma coroa toda à roda de espinhos
E os pés espetados por um prego com cabeça,
E até com um trapo à roda da cintura
Como os pretos nas ilustrações.
Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas -
Um velho chamado José, que era carpinteiro,
E que não era pai dele;
E o outro pai era uma pomba estúpida,
A única pomba feia do mundo
Porque nem era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.
Não era mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe,
E que nunca tivera pai para amar com respeito,
Pregasse a bondade e a justiça!

Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz
E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o Sol
E desceu no primeiro raio que apanhou.
Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias.

A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
Aponta-me todas as coisas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.

Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente,
Sempre a escarrar para o chão
E a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou -
"Se é que ele as criou, do que duvido." -
"Ele diz por exemplo, que os seres cantam a sua glória,
Mas os seres não cantam nada.
Se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres."
E depois, cansado de dizer mal de Deus,
O Menino Jesus adormece nos meus braços
E eu levo-o ao colo para casa.

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural.
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que eu sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.

E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre.
E que o meu mínimo olhar
Me enche de sensação,
E o mais pequeno som, seja do que for,
Parece falar comigo.

A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.

A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontado.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.

Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos e dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.

Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas
No degrau da porta de casa,
Graves como convém a um deus e a um poeta,
E como se cada pedra
Fosse todo o universo
E fosse por isso um grande perigo para ela
Deixá-la cair no chão.

Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens
E ele sorri porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade
Que uma flor tem ao florescer
E que anda com a luz do Sol
A variar os montes e os vales
E a fazer doer aos olhos dos muros caiados.

Depois ele adormece e eu deito-o.
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.

Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos.
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono.

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é.

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Esta é a história do meu Menino Jesus.
Por que razão que se perceba
Não há-de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam?

terça-feira, dezembro 19, 2006

PODER E IDENTIDADE EM UPSTAIRS DOWNSTAIRS (1º Episódio, Esboço)

Faz 2 meses que comprei a primeira parte da série britânica Upstairs Downstairs (intitulada em português A Família Bellamy), produzida, em 1971, pela Granada, para a televisão. Tinha visto partes na RtpMemória e fiquei muito curioso. Recentemente a FNAC colocou a série ao preço da chuva e eu não resisti a comprar a segunda parte.

O microcosmos duma família aristocrática britânica dos começos do século XX, é o pretexto para uma análise contundente das diferentes formas de poder na sociedade em geral (Mr. Bellamy, o patrão, é membro do parlamento, pelos torys).

O primeiro episódio (da primeira série), On Trial (1) descreve a recepção de Sarah, a nova criada, na família. A cena da entrada física da criada com um picado e contrapicado relativos ao ponto de vista do mordomo, Mr. Hudson, desde a entrada principal do edifício e o do olhar da criada a partir das escadas que ligam a rua à porta. Sem lhe dirigir a palavra, Mr. Hudson indica, com um aceno de cabeça, a porta dos fundos. Aí, ela vai apresentar-se como pretendente à vaga de criada de sala, quando, aquela que já ocupa esse lugar, Rose, que a recebe, informa-a de que só há vaga para ajudante de criada de sala. Nas conversas trocadas entre os membros da criadagem, acusam-na de não ter maneiras ao querer entrar pela porta principal. Todos eles, por malvadez, à excepção duma criada, consideram a estranha inapta ao serviço, mas se os patrões a contratarem o dever dos subordinados é aceitarem a sua decisão. Tal como a patroa, também a cozinheira exige outro tratamento, proibindo-a de a tratar apenas pela função que ocupa na casa: a cozinheira tem um nome, Mrs. Bridges.

O elegante ambiente doméstico é uma ironia do que verdadeiramente se passa sob a superfície: as relações de poder entre os habitantes da casa. Podemos observar como esse poder é exercido quer entre os Bellamy e os criados quer, mais interessante ainda, como ele se vai jogando entre os próprios subordinados, multiplicando-se em cadeia, por imitação.

Mas o poder também se encontra, à sua maneira, do lado de Sarah. De facto, o seu maior poder é o da imaginação, que a leva a mentir sobre a sua identidade, apenas por uma questão de sobrevivência. A recém-chegada serve-se igualmente do poder do medo, dizendo-se filha duma cigana, de quem herdou o dom de ler as mãos, da vidência e de lançar maldições.

Ao apresentar-se à sua patroa, que a obriga a tratar por Milady, Sarah usa uma carta de recomendação falsa, condimentada com uma história inventada por ela mesma, dizendo-se meia francesa, tendo regressado ao Reino Unido após a doença da sua mãe. Mrs. Bellamy augura a sua recuperação já que ela precisa de se concentrar no novo trabalho. A humilhação vai mais longe quando a patroa decide rebaptizá-la com outro nome, que soa mais a britânico, substituindo Clemence Dumas por Sarah, considerando o anterior inapropriado. Mas Clemence é um pseudónimo, inventado pela própria, de que nunca saberemos o verdadeiro nome. Clemence ou Sarah é uma mulher à deriva, de origens miseráveis, a filha mais velha que teve que cuidar de muitos irmãos, pretendendo esquecer e ocultar as suas origens.

O jantar é como que a prova iniciática em que a neófita ficará ciente do seu lugar na hierarquia da casa: o mordomo, Mr.Hudson, e a cozinheira, Mrs. Bridges, sentados em ambos os topos da mesa, comandam os destinos da criadagem. Depois duma curta oração, em que o mordomo agradece a Deus pela refeição e pela posição que os presentes ocupam na escala social, por vontade Dele, Sarah lança-se furiosamente ao borrego, de que se queixa o cocheiro. Quem dera a muitos ter uma refeição destas uma vez por semana, não é Sarah?, diz o mordomo. Mas a criada “ensurdeceu”. A fome era negra. Os seus colegas chamam a atenção para a sua falta de respeito, já que Mr. Hudson lhe dirigiu a palavra. Mas ela tem resposta imediata, como sempre, confessando que ainda não se habituou à sua nova identidade. O mordomo repete a pergunta. Da segunda vez, Sarah mostra como aprendeu bem a lição, ao reconhecer aquele que, dali em diante, se encarrega da sua vontade individual, respondendo, como se tratasse duma palavra-passe, a algo que nem sequer ouviu: Yes, Mr. Hudson. A cara do mordomo rejubila, tranquilo, percebendo que a ordem foi finalmente restabelecida.

A nova criada não esconde que gosta muito de histórias que a fazem esquecer a sua própria história. Ao descobrir que a cozinheira rouba galinhas da despensa dos patrões, para vendê-las em seguida, Sarah faz o mesmo, como em uma atitude de desafio e jogo. No julgamento caseiro, conduzido, como não podia deixar de ser por Mr. Hudson e Mrs. Bridges, chamam-na de vulgar, mentirosa e ladra, sendo condicionada a aceitar, em cada “sim” que profere, que é uma subordinada. Ameaçam em contar tudo aos patrões. O mordomo obriga-a a escrever 10 vezes o mandamento adequado à ocasião. Mas ela mostra-se incapaz de o fazer, pois é analfabeta. A esta revelação, o mordomo e a cozinheira decidem suspender, como um acto de falsa compaixão, a acusação perante os Bellamy.

Sarah é uma personagem de recorte romântico, com forte personalidade, e decide abandonar a casa, pois não suporta mais as humilhações de que tem sido alvo, a anulação da sua própria individualidade. Na despedida, Sarah diz a Rose, a colega com quem partilha a cama no sótao, que a criadagem se assemelha a uma trupe de fantasmas, vivendo em função dos patrões e dos seus caprichos. Rose previne-a da dificuldade em arranjar emprego, mas a outra confessa que não acalenta grandes ambições em relação ao trabalho, pois o seu mais profundo desejo é viver.
Mais tarde falarei no segundo episódio, também muito interessante.
A.M.
(1)- On Trial tem um significado ambíguo, pois tanto se pode traduzir por “à experiência” (seja da nova criada, seja do episódio piloto da série), como funcionar também para julgamento, o que acontece de facto nesse episódio, o julgamento da própria Sarah.

quinta-feira, dezembro 14, 2006


O Comício do Gato

segunda-feira, dezembro 11, 2006

AMOR À CIDADE
Nós bem diziamos que a Baixa está em alta. É que, por aqui, a atmosfera, ainda que com algum fumo, não está viciada pelo ar condicionado e pelas nuvens de espirros. A luz que aqui temos vem do sol e não dos focos. A oferta é diferenciada: desde antiquários a lojas new age. Os edifícios têm personalidade e história, com portas (vejam alguns batentes, que maravilha!) e janelas desenhadas à maneira, que dá gosto parar para observar. Por aqui, ainda se vêem cães a brincar, descuidados, no meio da rua, ou postados em frente ao talho em posição hirta, orelhas em pé e olhar suplicante, ou, então, ladrando, obstinadamente, para uma senhora com uma tíbia da pastelaria. Há a solidariedade dos vizinhos.
A.M.
Alguns exemplos de amor à cidade.

quarta-feira, dezembro 06, 2006

Copos esfíngicos
(Alt. aprox. 7 cm, Compr. 4/ 7 cm)

Galos
(Alts. aproxs. 14/ 18 cm)

Garrafas Antropomórficas
(Alt. aprox.: 32 cm)

Candelabro



Garrafa
(Alt. aprox.: 29 cm)

INFORMAMOS
QUE O HORÁRIO DE NATAL DA GALERIA SARGADELOS É O SEGUINTE:

De 18 a 20 de Dezembro
(Segunda-Feira - Quarta)
10h00-19h30
21- 23 de Dezembro
(Quinta, Sexta e Sábado)
10h00-23h00
24 de Dezembro
10h00 - 19h30