segunda-feira, junho 11, 2007

As margens sacralizadas do Douro através de vários cultos (Lello Ed), de Dalila Pereira da Costa, analisado aqui, por Alexandre Teixeira Mendes. O livro tem como base de estudo as gravuras do Parque Arqueológico do Côa para uma hermenêutica do sagrado, enquanto "cosmovisão telúrica", em comunidades cuja organização matriarcal, e, portanto, o seu imaginário e as suas expressões remetem para o Grande Feminino. Como diz, acertadamente, A.T.M., nestes casos "não basta actuar como arqueólogo, mas como um hermeneuta."

"Para a cultura portuguesa a sua importância – enquanto testemunho de um passado já extinto - ainda não foi integralmente avaliada (não faltam perspectivas gerais acerca desta cultura milenar onde, na estrutura ou tablado social, se admite, ou ao menos se subentende, o mundo psíquico-arquetípico do Grande Feminino hoje ainda presente em Portugal-Galíza). Trata-se de uma cultura peculiar e ímpar onde – no seu simbolismo manifesto e explícito – se evidencia uma cosmovisão telúrica e seu intento por implicar todas as realidades desde a “Terra Mãe”: os minerais, os vegetais e os animais, assim como a própria terra, a água, o fogo e o ar.
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As peripécias da vida, formação e actividades de Dalila Pereira da Costa no curso dos seus 90 anos (nasceu no Porto em 1918) estão relatados na sua autobiografia “Os Instantes nas Estações da Vida” (Lello Ed). Ela ocupa posto de absoluto destaque no cenário dos estudos da fenomenologia e teoria da experiência mística, hermenêutica do sagrado na arte e na história (o que nós entendemos como “paideuma” português). Ligada familiarmente a Santa Marta de Penaguião, outrora pertencente à antiga Terra de Panóias, Dalila Pereira da Costa tem dado realce, desde o início, a bipolaridade de forças que teriam regido a nossa vivência (desde os tempos primordiais). Dois pólos complementares, segundo a sua perspectiva, como o telúrico feminino e lunar, representado pela serpente: o mito ofidiano (Da serpente à imaculada, Lello Ed,). Precisemos, desde já, que a sua extensa obra mística e hermenêutica - pela pluralidade de abordagens - delimita uma re-aproximação à hermenêutica da história, da língua, da poesia.
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Se há um tema característico de Dalila Pereira da Costa é o sagrado. E numerosas são as monografias sobre a vertente hermenêutica aplicada aos textos literários – a poética do mito (designemo-lo assim) em Fernando Pessoa, Guimarães Rosa ou Herman Melville - e a lógica da reflexividade em torno dos mitos fundadores e da simbólica da cultura portuguesa – justamente a partir de leitura das ideias filosóficas-literárias ou poéticas, arqueológicas, icónicas e pictóricas."